A subida é séria. O sol enrijece. O suor encharca a
camisola. A garganta resseca...
Há que caminhar pelas sombras das árvores que se interpõem no caminho para assim contornar os 37 graus que queimam a pele...
Há que caminhar pelas sombras das árvores que se interpõem no caminho para assim contornar os 37 graus que queimam a pele...
Eram dez horas da manhã e mais quatro pela frente,
sem alguma actividade...
Só a aguçada naifa, a carteira, as calças negras
de ganga gasta, o pólo verde-escuro, o boné no mesmo tom, o bornal a tiracolo e
a digital faziam companhia...
Podia ser que sim, que encontrasse uma fonte ou um qualquer tasco algures no PR8- PNV onde pudesse trocar aconchegar o estômago...
Mas não. Naquele dia e àquela hora, a
hospitalidade era ingrata.
Nem vivalma...
Nos campos e nas aldeias...
Tudo encerrado em casa, toda a gente recolhida, esquivando-se do calor...
Só o silêncio, o restolhar da folhagem tocada por breves lufafas de brisa, o grasnar dos corvos vigilantes vergastando as copas
das árvores e uma por outra ave de rapina pairando bem lá no alto faziam companhia ao caminhante... de quando em vez,
o aroma das estevas, da urze, do
rosmaninho, e do fundo do cavado vale, um cheiro a putrefacção...
Andando e encontrando o velho lagar, cercado de
silveiral, o rápido da ribeira e a nora do poço completavam aquele quadro bucólico...
Mais adiante, a pequena ponte romana vencia o
curso de água cristalina que serpenteava entre rochas e vegetação rasteira...
Os muretes de xisto colocado a cutelo ajudavam a
reter as margens da Ribeira da Figueira,
bem como a sua avantajada largura permitiria a circulação das pessoas com os seus haveres agrícolas, e conduziam o precioso
líquido pelas estreitas levadas...
Subindo o trilho inflectido à esquerda e rumando a Norte, logo o horizonte se nos revelava o parque
eólico da cordilheira das Corgas, uma parte da Serra das Talhadas, avistando-se o branco casario do Pereiro a meia encosta.
Quinze minutos vencidos e a direita do caminho presenteou uma alminha, nicho de romarias e devoção cristã, ornamentado a flores
artificiais...
Sempre andando, e uma vez que o tempo parecia sobrar, foi hora de fazer um pequeno
desvio ao trajecto proposto no PR 8 e
subir cerca de um quilómetro na direcção ao pequeno casario dos Sesmos...
aí destacando-se uma linda habitação reconstruida em
xisto...
Pelo rescaldo desta caminhada, na “Loja da Aldeia,” estabelecimento que
funciona como restaurante, café e mercearia da povoação da Figueira, enquanto refrescava a ressequida garganta com duas stout geladinhas, em amena cavaqueia com duas residentes que tomavam café n a mesma mesinha, explicaram que Sesmos é a terra das
cerejas, percebendo cá o Cidadão que este epítetoafinal não se cinge a Alcongosta nem sequer à Serra da Gardunha.
Já à distância se fazia ouvir o repicar dum sino anunciando as 13 horas,
quando a partir de Sesmos se retomou o trilho
do Caminho do Xisto de Figueira, rumo à
povoação do Pereiro que sobre as copas das árvores, se mostrava longínqua...
Aldeia onde houve
oportunidade de fotografar alguns dos palheiros que abrigavam os tradicionais carros de bois...
Durante todo este trajecto, de gentes, nem
vivalma...
A água da fonte mostrava-se duvidosa e antes ter de passar um bocado de sede, que sofrer uma gastroenterite...
Só dois cães de basto pelo e grande porte se atalharam ao caminho, ladrando furtivamente... Foi altura de mui discretamente preparar
os 15 aguçados centímetros da naifa, pese escondida, não fosse por lá
os cães trazerem as ideias fixas...
Aparentemente fartos de carnes, um indício tranquilizador de que
seriam bem alimentados...
Não deixar que o medo se apodere de nós para que não produzamos odor a adrenalina, agachar, primeiro com atitude cabisbaixa e
depois, olhando directamente nos olhos do líder e verificando se as caudas subiam acima do nível do lombo, abanando em gancho.
Esticar suavemente a mão em direcção ao focinho do mais próximo, acariciando-lhe o focinho bem acima do nariz...
A tal técnica de sedução voltou a funcionar na
perfeição, assim se fazendo mais dois amigos de quatro patas...
Num dos pátios sombrios a um nível mais elevado que o caminho, o primeiro humano encontrado durante esta caminhada, observava estático.
E o Cidadão dirigiu-lhe a palavra...
“Boa
tarde... Aqui é que é o Pereiro?!”
O individuo forte, de cabeleira fartamente encaracolada e
aparentando as suas trinta primaveras vividas,furtivamente por duas vezes retorquiu...
“O quê? O
quê?”
E aquele estranho residente, virando-se em sentido contrário, raspou-se para
dentro de casa, cuja porta bateu violentamente, deixando a aldraba em franca oscilação...
Mais umas fotos tiradas à romãzeira que se destacava no pátio...
Pois de romãzeiras, gerânios...
malvarosas, alfazema...
malmequeres amarelos...
e roseiras...
Com o calor cada vez mais implacável, penosamente foi o caminheiro subindo o povoado...
Inflectindo a Sul, foi apanhando um pequeno troço
de alcatrão cujas ondas de calor induziam o caminheiro em erros de
paralaxe.
e a Sudoeste, as escarpas do Almourão escondiam o Vale do Ocreza e as Portas de Ródão...
Bateram 14 badaladas quando, sempre a descer pelo trilho rudimentar...
o viajante cruzou por um abrigo algo peculiar...
e atravessando outro pequeno pontão que vencia a ténue Ribeira da Figueira,
se lhe seguiu outra
subida bem íngreme, disputada passo após passo, metro após metro, sob Sol escaldante, na direcção à Aldeia de Xisto, sem que de permeio houvesse uma buchinh, ou sequer uma pinguinha de água potável para enganar o estômago e refrescar a garganta ressequida...
Indo este post bastante extenso, as fotografias da aldeia do xisto seguir-se-ão na próxima publicação...
1 comentário:
Estas lindas imagens comprovam que Portugal tem recantos encantadores que vale a pena visitar.
Um abraço
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